Multimorbilidade foi o tema marcante do segundo dia do CNMI

Numa conferência com o tema “O desafio da multimorbilidade”, Luís Campos percorreu os dados mais recentes sobre o tema e deixou alertas aos internistas, incitando a que façam mais e melhor em prol dos doentes que enchem as enfermarias.

O presidente da Sociedade Portuguesa de Medicina Interna (SPMI) começou por apontar que Portugal nada tem sido feito para preparar uma resposta aos doentes que surgem nos hospitais com múltiplas patologias e lembrou que este é um fenómeno que pode fazer colapsar um sistema de saúde. A juntar a isto, lembrou que a evolução demográfica e populacional não enganam:

Luís Campos durante a sua apresentação no 24.º CNMI

“Temos dois milhões de idosos e em 2050 poderão ser 3,5 milhões. Com a idade vão-se acumulando as patologias… É um silver tsunami que está a invadir os sistemas de saúde. Estes doentes são os grandes consumidores e gastadores dos cuidados de saúde, além de que são também aqueles que têm problemas sociais mais graves, não sendo de admirar que os serviços de medicina estejam transformados em centros de resolução dos problemas sociais das pessoas”, disse o internista, deixando nota de outro problema que em breve pode condicionar ainda mais as respostas dos especialistas: o crescimento do conhecimento.

“Em 2020 calcula-se que o conhecimento duplique a cada doze horas. Na Medicina isto traduz-se numa hiperespecialização crescente, com gente que sabe cada vez mais de cada vez menos. Se a isto juntarmos o aumento do preço dos medicamentos, temos a certeza de que teremos necessariamente de arranjar novas estratégias para lidar com a multimorbilidade.”

Luís Campos apontou que estes doentes estão a ser tratados nas urgências, “de forma fragmentada, reativa, focada na doença”, frisando que o caminho passa pela prevenção, qualificação dos recursos humanos e formação.

“O nosso modelo já não é adequado aos doentes. Por isso, defendemos modelos departamentais geridos pela Medicina Interna, que deve coordenar os restantes serviços. Outra coisa que temos de fazer é fomentar diferentes formas de ser internista. Temos de ter diferentes perfis, desde o internista holístico até aos mais diferenciados”, avançou o diretor de Medicina Interna do CHLO, que terminou lembrando que a solução só pode passar pela integração dos cuidados hospitalares com a aposta em vias alternativas, como a hospitalização domiciliária, unidades de diagnóstico rápido e articulação com os hospitais de dia, e uma forma de pensar a Saúde que não deixe de lado as questões sociais.

A Saúde não conhece fronteiras

Ainda antes da conferência de Luís Campos, a encerrar mais uma manhã de trabalhos no CNMI, teve lugar uma sessão com o tema “Saúde 100 fronteiras”, onde foram debatidas questões relacionada com os fluxos migratórios e as suas implicações no domínio da saúde.

Alexandre Abrantes, da Escola de Saúde Pública, salientou que o livre movimento de pessoas, ideias e culturas tem tido grande impacto no âmbito da saúde e estilos de vida. Ainda assim, admitiu que é difícil avaliar prós e contras.

“O balanço é difícil de concretizar, mas diria que, de forma geral, a globalização está associada à quebra de situações de pobreza extrema, o que a meu ver torna o resultado positivo.”

A moderadora desta sessão, Ana Glória Fonseca, especialista em Medicina Interna do Hospital Garcia de Orta, admitiu também a dificuldade em fazer balanços finais dos fluxos migratórios, mas referiu que a globalização gera oportunidades e desafios que têm de ser aproveitados no sentido de melhorar e prevenir a saúde de todos.

“Se a migração abre e fecha fronteiras conforme os ritmos definidos politicamente, os agentes e vetores de doenças circulam sem conhecer nem respeitar fronteiras, resultando na importação e emergência de doenças que desafiam sistemas de saúde e geram alerta global”, dando o exemplo do dengue, sarampo, SARS ou ebola. Perante tal cenário, a especialista frisou que conhecer o estado e necessidades das populações migratórias permite “promover, prevenir e controlar a doença para obter mais impacto em termos de ganhos de saúde”.

Parceria com a Medicina Interna espanhola

Foi assinada este sábado, durante o Congresso Nacional de Medicina Interna, a declaração conjunta para integração da Medicina Interna nos futuros sistemas de saúde. Jesus Diaz, vice presidente da Sociedade Espanhola de Medicina Interna, e Luís Campos, presidente da Sociedade Portuguesa, assinaram o documento.

(03/06/18)