Médicos Internistas lançam livro «Registo e Raciocínio Clínico»

A aposta no raciocínio clínico é precisamente um dos pontos que João Araújo Correia pretende dar ênfase durante o seu mandato como presidente da SPMI, entre 2018 e 2021, tendo sido no decorrer do último Congresso Nacional de Medicina Interna, onde tomou posse, que a obra foi oficialmente apresentada.

Como é que se consegue então um equilíbrio entre as guidelines e esse raciocínio? Em declarações à Just News, o médico, e diretor do Serviço de Medicina Interna do Centro Hospitalar do Porto, desde logo destaca que “o raciocínio clínico é dos principais contributos que a Medicina Interna pode dar à Medicina”.

Na sua opinião, “hoje em dia pratica-se muito a chamada ´medicina de cardápio`, que assenta sob guidelinescom base científica”. E, se é certo que “estas são importantes”, João Araújo Correia adverte que “não podemos esquecer-nos que os doentes que chegam a nós são cada vez mais complexos e que essas orientações devem ser adaptadas às individualidades de cada pessoa”.


Os dois autores da obra: João Araújo Correia e Vasco Barreto

Registar os problemas “antes do diagnóstico”

O presidente da SPMI recorda que o raciocínio clínico “baseia-se bastante no método do registo médico orientado por problemas de Laurence Weed, que faleceu o ano passado. Antes da era dos computadores, este visionário escreveu um método que em vez de se basear o raciocínio clínico em diagnósticos prováveis, o que se regista são os problemas do doente antes do diagnóstico.”

A questão, salienta, “é que quando pensamos primeiro em diagnósticos, acabamos por minorizar alguns problemas e por hierarquizá-los, além de que nos pode escapar algum”. É neste contexto que sobressai “a prática de uma Medicina de alto valor, que implica ter tempo para ouvir os doentes, evitando o refúgio nos tempos definidos para consulta por parte das administrações.”

E acrescenta: “O doente tem a sua própria individualidade. Com este raciocínio, consegue-se juntar várias peças para depois se completar o puzzle”. Contudo, tal implica “saber lidar com a suspeição e a insegurança constante, que também é o que nos dá mais satisfação pessoal. Nenhum problema deve ser considerado menor.”

“Cada pessoa é única”

Há ainda o caso muito específico dos doentes mais idosos. “Em Portugal temos, atualmente, 2 milhões de velhos, calculando-se que, em 2030, esse número chegue aos 3,5 milhões”, afirma o diretor do Serviço de Medicina Interna do Centro Hospitalar do Porto.

João Araújo Correia refere que, “há 20 anos, costumava-se dizer que, a partir dos 65 anos, deveríamos pensar que há um diagnóstico que explica toda a situação de determinado doente”. Atualmente, a realidade é bem diferente:

“Hoje em dia, não tenho nenhum doente no meu consultório sem 8 ou 9 diagnósticos. Estamos perante muitas doenças que implicam polimedicação e que aumenta a individualidade de cada pessoa que nos pede ajuda.”

E sublinha: “É preciso conhecer as guidelines e as normas de orientação clínica, mas temos que nos lembrar que cada pessoa é única. E há ainda certos casos mais complexos que não participam nos ensaios clínicos e nos estudos.”

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