Formação Amiloidose hATTR do NEDR – O encerrar dum projeto com Chave de Ouro

PROGRAMA RARE AWARENESS do NEDR, criado em 2019,  e os diferentes projetos nele inseridos, têm como principais objetivos a consciencialização para as doenças raras e a atualização científica de profissionais de saúde.

O projeto PAF 2019-2020, dedicado à amiloidose hereditária associada à transtirretina, e que conta já com várias ações e atividades realizadas neste último ano, tem programado para o seu encerramento a Formação Amiloidose hATTR para profissionais de saúde, no último quadrimestre de 2020. Com 5 módulos em formato online e com a possibilidade de interação em direto com os formadores, esta ação gratuita, constitui uma oportunidade única para todos os profissionais de saúde com interesse nesta área. Serão abordados, por peritos nacionais, temas de fisopatologia e manifestações clínicas, genética e diagnóstico diferencial, acompanhamento, referenciação e terapêutica. No último módulo serão ainda discutidos casos clínicos de vida real, com a participação de um doente, em estreita articulação e colaboração com a Associação portuguesa de paramiloidose.

Um encerramento com chave de Ouro para o primeiro projeto deste programa! Não faltem!

A amiloidose hATTR resulta da desformatação da transtirretina (TTR), proteína ubíqua, transportadora da hormona tiroideia Tiroxina e da Vitamina A, que é sintetizada no fígado, sistema nervoso central e na retina. Existe uma forma genética determinada por mutações no gene efetor da TTR e uma forma não familiar por degradação espontânea da TTR nativa, na sua variante selvagem.

Esta forma de amiloidose foi descrita pela primeira vez pelo neurologista português Corino de Andrade em 1952.

A degradação da transtirretina leva à formação de fibras amiloides que se depositam em vários órgãos causando um fenótipo neuropático, um cardíaco e formas mistas. São também tipicamente atingidos os olhos, o tubo digestivo, sistema osteoarticular e os rins, geralmente com menor gravidade. Como resultado, ocorre uma disfunção multiorgânica progressiva e irreversível, rapidamente incapacitante, podendo ser fatal, se não for instituída terapêutica adequada, em 10 anos.

Na forma genética, de predomínio neuropático, a hATTR atinge, em todo o mundo, cerca de 10 mil pessoas, e destas 20% são portuguesas. Embora se trate de uma doença rara a nível mundial, a estreita associação com a população portuguesa, leva a que Portugal seja o país mais atingido, com uma prevalência de 23 : 100000 adultos, ou seja, um total de 1.865 doentes (dados de 2016).

Entre 2010 e 2016 foram diagnosticados 71 novos casos/ano, correspondendo a uma incidência de 0.87 : 100000 adultos. sendo que destes, 28,7% tiveram início tardio dos sintomas (>50anos). A idade média de início dos sintomas é aproximadamente 43 anos e os homens e as mulheres são igualmente acometidos.

São sinais e sintomas cardinais da doença a associação das manifestações neurológicas, cardíacas, a amiloidose vítrea e o síndrome do canal cárpico, sendo os restantes de apresentação muito variável.

Na forma familiar, predominam, e são mais precoces, as queixas neurológicas, sendo a miocardiopatia geralmente de expressão mais tardia e numa mesma família podem ter uma progressão diversa de caso a caso e nas várias gerações. É determinante na sua expressão a mutação presente.

Na variante não genética, predomina claramente a miocardiopatia e podem estar apenas presentes as manifestações osteoarticulares e o síndrome do canal cárpico, havendo escassa expressão neuropática.

De acordo com o envolvimento dos vários órgãos, o acompanhamento destes doentes deve ser assumido por uma equipa multidisciplinar, em centro de referência.

Para além da avaliação pluridisciplinar das diversas disfunções de órgão ou sistema identificadas por diversos exames complementares (neurológicos, cardiológicos, oftalmológicos, etc.) o diagnóstico definitivo, é na forma familiar, realizado por teste genético, confirmando-se a presença da mutação responsável pela doença. Pode, no entanto, ser necessário confirmar a presença de substância amiloide em algum tecido através de biópsia.

Nas famílias das pessoas afetadas, é possível identificar parentes portadores do gene alterado e que, por isso, estão em risco de desenvolver a doença.

Sempre que não existam sintomas da doença, o teste genético (i.e teste preditivo) está disponível a partir dos 18 anos de idade, sendo este realizado apenas em consulta de genética médica.

Na forma esporádica, em que não há história familiar, não existem mutações genéticas identificáveis, torna-se indispensável a demonstração histológica, sendo apenas definitiva na maioria dos casos a biópsia miocárdica. Nos últimos anos cresceu a importância de métodos com radioisótopos, em que por exemplo a cintigrafia miocárdica por difosfonatos revelou elevada sensibilidade e especificidade diagnóstica.

Para além das terapêuticas sintomáticas, que apoiam o controlo das disfunções orgânicas, são métodos específicos para a patologia:

– o transplante hepático, sendo o fígado a fonte primária da proteína anormal, foi a primeira hipótese terapêutica disponível, continuando hoje a revelar-se como uma opção bem estabelecida para travar a progressão da paramiloidose e aumentar a qualidade de vida dos doentes, desde que realizado numa fase inicial da doença;

– novas opções, baseadas nos diferentes mecanismos da doença, nomeadamente, os medicamentos Tafamidis, Patisiran e Inotersen, foram disponibilizadas nos últimos anos e demonstraram estabilizar a doença, proporcionando melhoria sintomática e prolongando a autonomia dos doentes, com impacto positivo na sua qualidade de vida.

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Luísa Pereira
Luís Brito-Avô

Coordenação do Núcleo de Estudos de Doenças Raras