SPMI e APAH juntaram-se para debater o tema Saúde e Segurança Social

A Sociedade Portuguesa de Medicina Interna (SPMI) e a Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares (APAH) promoveram no passado dia 15 de maio, no Centro Cultural de Belém, uma conferência aberta sobre o tema “Saúde e Segurança Social – A necessidade de um pensamento global”.

Luís Campos, na sua intervenção inicial, relembrou que os hospitais estão transformados em centros de resolução dos problemas sociais das pessoas e que é cada vez mais difícil separar as questões de saúde da esfera social.

“Estamos perante um dos maiores problemas que a sociedade contemporânea enfrenta e um dos mais graves casos de insensibilidade social”, afirmou o presidente da SPMI, que relembrou também as mudanças sociais a que temos assistidos nos últimos anos e que devem levar a um novo paradigma na Saúde.

Manuel Lopes, Luís Barbosa, Teresa Anjinho, Alexandre Lourenço, Vera Lúcia Arreigoso, Paulo Telles de Freitas, Anne Hendry, Fernando Araújo e Luís Campos

“Vivo nos hospitais há 40 anos e nesse espaço temporal assistimos a inúmeras mudanças, desde a mudança do conceito de família, à emancipação da mulher, ou o aumento da esperança média de vida. O envelhecimento é também uma realidade: há 40 anos tínhamos cerca de um milhão de idosos, hoje são mais de dois milhões e as previsões apontam que em 2050, em Portugal, serão 35% da população. Este panorama leva a que os nossos hospitais tenham sido invadidos por uma população maioritariamente idosa, com multimorbilidades e doenças crónicas, e algo tem de ser feito, pois deparamo-nos diariamente com a falta de resposta dos cuidados continuados e sociais”, frisou o internista, que acrescentou que este é um dos piores exemplos de desperdício no SNS.

“A SPMI tem falado frequentemente deste problema, mas estamos conscientes da sua complexidade: temos de investir mais em cuidados paliativos e na assistência social, integrando a saúde e a segurança social, num processo que envolve não só a segurança social, mas as próprias comunidades e autarquias. É também necessário alterar a legislação e urgente que a Saúde e a Segurança Social pensem estas questões em conjunto, algo que já está a acontecer em muitos países. Manter o atual sistema é uma ameaça ao SNS e à sustentabilidade da sociedade como a conhecemos. Perante esta realidade só não temos a opção de não fazer nada”, concluiu Luís Campos.

Alexandre Lourenço concordou que a realidade hospitalar está de facto a mudar, com uma população cada vez mais envelhecida, mais doenças crónicas e em que a morbilidade passou a ser o padrão e não a exceção.

“Em Portugal têm-se acentuado os aspetos sociais e os hospitais são hoje palco de vários casos de origem social, que naturalmente condicionam os resultados de Saúde”, explicou o presidente da APAH, que frisou que estão a prestar-se cuidados de uma “forma desadequada e insatisfatória para a exigência de qualidade da população”.

“Entendemos que os hospitais sozinhos não são capazes de melhorar os cuidados de saúde prestados e por isso é necessário criarmos parcerias que possam mudar a realidade do setor e dar origem a um novo modelo de prestação de cuidados”, sublinhou, esclarecendo que nesse sentido é importante a ligação com a SPMI, “pois os internistas são possivelmente os especialistas que mais lidam com esta problemática e com eles torna-se possível começar a procurar o melhor caminho para resolver esta questão”.

A experiência escocesa

Uma das convidadas desta conferência foi Anne Hendry, professora universitária e internista de formação em geriatria e AVC, mas também Responsável da Fundação Internacional para os cuidados integrados na Escócia e Responsável Nacional pelos idosos e cuidados integrados naquele país.

Relatando a sua experiência de integração entre a Saúde e a Segurança Social na Escócia, a especialista começou por afirmar que também naquele país existia uma fragmentação entre a área da Saúde e o plano da Segurança Social, mas que nos últimos 10 anos foi possível erguer um programa de cuidados domiciliários gratuito para pessoas com mais de 65 anos. A solução, confessou, foi simples: a dureza dos números.

“Sabíamos que os nossos hospitais estavam ocupados com pessoas com mais de 65 anos, por isso fizemos cálculos e descobrimos que se mantivéssemos esse ritmo de hospitalizações precisaríamos de mais 6000 unidades hospitalares. Algo impensável, até porque não teríamos a força de trabalho necessária.”

A internista revelou ainda que ao longo do processo ficou claro que as próprias pessoas querem estar em casa, desde que seja seguro e tenham os cuidados necessários, com qualidade.

“Iniciámos este debate, enfrentámos o período de crise, mas com um governo maioritário tivemos a janela de oportunidade para fazer a mudança de forma ambiciosa, não só procurando poupar dinheiro, mas fazendo sobretudo um melhor uso dos meios para dar às pessoas melhor qualidade de vida.”

Trabalho de equipa é a chave

Depois de um debate que reuniu os especialistas Paulo Telles de Freitas, Responsável da Unidade de Cuidados Intensivos do Hospital Fernando da Fonseca, Luís Barbosa, ex-ministro dos Assuntos Sociais, Teresa Anjinho, provedora-adjunta de Justiça, e Manuel Lopes, coordenador da reforma do SNS para a área dos CCI e coordenação estratégica do projeto SNS + Proximidade, coube ao Secretário de Estado Adjunto e da Saúde, Fernando Araújo, encerrar a sessão, garantindo que a resolução dos problemas sociais que estão a alastrar nos hospitais requer um trabalho alargado e com mais intérpretes do que somente as autoridades da Saúde e da Segurança Social.

“Temos de atuar em conjunto. Temos de continuamente insistir e persistir num trabalho entre a Saúde e outras áreas de decisão. Se pensarmos que este é um problema somente da área da Saúde estamos enganados. É muito mais do que isso. Temos de ser mais abrangentes de forma a que os doentes possam estar em casa com a família, mas de forma digna, humana e o mais aconchegados possível. É um trabalho de várias áreas do governo e de outras áreas da sociedade, que é essencial não só para melhorar a qualidade dos cuidados, mas também de modo a garantir a sustentabilidade do Estado social como hoje o conhecemos”, terminou.

(17/05/2018)