Resposta ao ataque lançado à Medicina Interna

Comunicado da Sociedade Portuguesa de Medicina Interna e do Colégio de Medicina Interna da Ordem dos Médicos

A Sociedade Portuguesa de Medicina Interna (SPMI) e o Colégio da Especialidade de Medicina Interna da Ordem dos Médicos (CEMI) vêm lamentar profundamente e manifestar a sua indignação pelo ataque lançado contra a Medicina Interna, através das consultas de doenças autoimunes asseguradas por internistas, na forma de uma carta da direção da Sociedade Portuguesa de Reumatologia (SPR) ao Ministro da Saúde, que foi parcialmente divulgada pela Agência Lusa. Expressam também a sua solidariedade com os cerca de 300 colegas internistas que, de forma competente e abnegada, asseguram estas consultas e unidades e que foram objecto deste ato difamatório que atinge todos os internistas.
A divulgação pública desta notícia é causadora de alarme e confusão junto do público, provocando dúvidas totalmente injustificadas nos cerca de trinta mil doentes com estas patologias que são tratados por internistas.
A Medicina Interna é uma especialidade nuclear no sistema de saúde português, sendo a especialidade mais numerosa nos hospitais do SNS, assegurando as urgências, o internamento, o apoio aos outros serviços no hospital, as consultas, os hospitais de dia, unidades diferenciadas e programas de integração com os outros níveis de cuidados. Enquanto especialidade generalista, o seu âmbito abrange todos os doentes com doenças médicas de todos os órgãos ou sistemas, estando particularmente vocacionada para os doentes com múltiplas patologias, com doenças sistémicas e sem diagnóstico.
As doenças autoimunes têm manifestações sistémicas frequentes, largo espectro de gravidade e, por vezes, complicações graves relacionadas com os medicamentos usados. Por isso, são situações para as quais os internistas, especialmente aqueles que asseguram as consultas ou unidades de doenças autoimunes, possuem a formação necessária. Como é apanágio dos internistas, sempre que é necessário é pedida a intervenção de outras especialidades. A importância dos internistas na abordagem destas doenças é bem expressa no facto de, em muitos países, a Reumatologia ser uma subespecialidade da Medicina Interna, na maioria ser necessário um estágio de três anos em Medicina Interna para ser Reumatologista (e não apenas um, como em Portugal) e ainda de algumas das melhores unidades europeias de doenças autoimunes serem da responsabilidade de internistas.
Em Portugal, os Serviços de Medicina Interna asseguram consultas de doenças autoimunes em todos os hospitais do SNS e é graças a estas consultas que milhares de doentes têm acesso a uma abordagem diferenciada e a terapêuticas inovadoras. A Medicina Interna tem um registo de doenças autoimunes, faz formação, tem investigação publicada nas melhores revistas internacionais e tem vários doutorados nesta área. Assim, não é por acaso que o Congresso Mundial de Autoimunidade, que se vai realizar em Maio de 2018 em Lisboa, tem internistas nos lugares de presidente honorário e de três vice-presidências.
O papel abrangente da Medicina Interna e a possibilidade de diferenciação dos internistas é bem afirmado entre nós pela diversidade de consultas temáticas que asseguram, como são exemplo, para além das Doenças Autoimunes, as consultas de Diabetes, de Acidente Vascular Cerebral, de Insuficiência Cardíaca, de Hipertensão, de Geriatria, de Cuidados Paliativos, de infecção pelo VIH, de Doenças Hepáticas ou de Nutrição Clínica. Todas estas consultas são reconhecidas e foram aprovadas pelos conselhos de administração dos hospitais onde existem, porque são efectuadas por internistas com preparação adequada e reconhecidos interpares.
Da mesma forma que a pessoa não é uma soma de órgãos ou sistemas estanques, nem sofre apenas de patologia orgânica, também as especialidades médicas têm que reconhecer áreas de sobreposição, entre si e com as especialidades generalistas. Essas sobreposições são naturais e são usualmente geridas de forma civilizada e deontologicamente responsável no contexto da atividade hospitalar.
Aos nossos doentes queremos garantir que as consultas de doenças autoimunes são asseguradas por internistas experientes, conhecedores e dedicados, com formação específica nesta área, e que, para além de tratarem estas doenças, bem como os efeitos secundários das medicações indicadas, têm também competência para tratar muitas outras doenças de que os doentes sofrem.
A SPR, com esta posição não fundamentada cientificamente, presta um mau serviço aos doentes, revela um comportamento eticamente reprovável e uma absoluta ausência de escrúpulos na defesa de interesses corporativos, assumindo uma posição que é do foro dos colégios de especialidade da Ordem dos Médicos e na qual, seguramente, muitos Reumatologistas não se revêem.
Este ataque põe em causa o bom nome, a honorabilidade e a competência profissional dos médicos internistas, não tem paralelo na história da relação entre sociedades científicas e, na nossa opinião, representa uma grave infração ao código deontológico da Ordem dos Médicos.
A SPMI e o CEMI na defesa do bom nome dos médicos que representam e da qualidade dos serviços prestados aos doentes, reservam-se o direito de, por todos os meios ao seu alcance e dentro dos limites das suas competências, exigir a reposição da verdade dos factos. Igualmente serão promovidas as ações necessárias junto do Senhor Ministro da Saúde e do Bastonário da Ordem dos Médicos.

Luís Campos – Presidente da SPMI
Armando Carvalho – Presidente do CEMI

27-04-2018