Medicina Interna presente na apresentação do Relatório Primavera 2018

Foi esta terça feira apresentado o Relatório Primavera 2018 da autoria do Observatório Português dos Sistemas de Saúde (OPSS). Com o título “Meio caminho andado”, o documento faz uma análise do setor da saúde e das medidas tomadas pela equipa ministerial do executivo liderado por António Costa, deixando também rumos alternativos em diversas áreas da Saúde.

Entre as principais conclusões do relatório está a de que está “longe de ser ganha” a aposta “emblemática” da atual legislatura na reforma do SNS. O documento considera que “a proposta de lei da Saúde Pública parece ser uma oportunidade para reforçar e modernizar a Saúde Pública no país” e fala de “carências estruturais”, nos Cuidados de Saúde Primários, “deixando dúvidas quanto ao grau de prioridade desta área para o governo”.

Outros dados do relatório indicam que “os resultados na reforma dos cuidados hospitalares são inexistentes, prevalecendo uma clara crise no setor”, agravada pela excessiva dependência entre a gestão hospitalar e a classe política.

No que diz respeito aos recursos humanos na saúde, o relatório sublinha “a fragilidade da informação”, o que considera ter implicações na “dificuldade em definir a força de trabalho que o país tem e, consequentemente, as necessidades a médio e longo prazo”.

Finalmente, ao nível da política do medicamento, a atenção dos investigadores centrou-se na análise nas assimetrias geográficas da despesa com medicamentos. A despesa nacional per capita com medicamentos (PVP) foi de aproximadamente 200 euros, sendo que a média nacional de despesa direta com medicamentos rondou os 71 euros, sendo o Alentejo e o Centro as regiões onde os portugueses mais dinheiro gastam, direta e indiretamente, em medicamentos, não sendo esta diferença inteiramente explicada pela composição demográfica das regiões.

Reforma do SNS está por fazer

Presente na sessão na mesa redonda que se seguiu à apresentação do Relatório Primavera 2018, Luís Campos afirmou que o principal problema é que, depois de “Meio caminho andado”, não há planificação para o caminho que falta fazer e esse será influenciado por quatro factores:

“Em primeiro lugar a evolução demográfica: os doentes que vamos ter serão cada vez mais idosos, com multimorbilidades, mais incapacidade, problemas sociais, cada vez mais informados e com expetativas exageradas. Depois, o crescimento do conhecimento, que tem como consequência uma hiperespecialização crescente. O terceiro fator é a ameaça à sustentabilidade do sistema, não só pela carga de doentes e doenças, mas pelo peso da inovação, e finalmente a tecnologia, que de facto veio modificar as funções das profissões e que permite que os doentes sejam capazes de assumir parte da gestão da sua saúde.”

Luís Campos, especialista de Medicina Interna

Identificados os vetores que têm condicionado e podem emperrar o SNS, o diretor do Serviço de Medicina do Hospital São Francisco Xavier lembrou que atualmente os cuidados prestados são “fragmentados, reativos, através das urgências, de forma descontinuada, tendo como centro a doença e não o doente”.

“Os grandes desafios são a integração de cuidados baseados em equipas multidisciplinares, e a necessidade de ser pensado de forma conjunta a saúde e o setor social, pois os hospitais estão transformados em centros de resolução dos problemas sociais das pessoas”, salientou, acrescentando que “também precisamos de um novo modelo hospitalar, com grandes departamentos médicos geridos por internistas, que coordenem a atividade das outras especialidades, de programas de cogestão dos doentes cirúrgicos e de implementar alternativas aos internamentos”, frisou o antigo presidente da Sociedade Portuguesa de Medicina Interna (SPMI), lembrando ainda que a qualidade e a diminuição da variabilidade deveriam estar no centro da decisão política.

Finalmente, enfatizou a importância da prevenção das doenças e promoção da saúde, na medida em que os comportamentos de risco são responsáveis por 40% da saúde das pessoas.

Ministro da Saúde destaca o meio caminho feito

Adalberto Campos Fernandes, ministro da Saúde, esteve também presente na sessão e no discurso de encerramento preferiu “ver o copo meio cheio” e pôr de lado o “fatalismo” de algumas conclusões do documento, embora elogiando a qualidade do trabalho científico desenvolvido pelo OPSS, que considerou ser “um exercício de verdadeira democracia”.

“Prefiro na minha análise fazer um elogio às reformas que este executivo levou por diante. Temos hoje mais investimento na saúde e mais profissionais qualificados. Bem sei que necessitamos de mais, mas rejeito-me a conduzir de novo o país a uma situação de desgraça nacional. Temos um caminho difícil a percorrer mas deixo aqui um desafio a todos: com a apresentação da nova Lei de Bases da Saúde, mobilizemo-nos para discutir o que realmente importa, sem medirmos o SNS pelos nossos interesses, por muito válidos que sejam”, afirmou o ministro, acrescentando que “as reformas não se fazem estalando os dedos” e que têm de ser construídas de forma “sustentada, inclusiva e humilde”.

A terminar, Adalberto Campos Fernandes desejou que o relatório de 2019 seja o melhor de sempre, mas recordando que a Saúde em Portugal está bem e recomenda-se.

“Temos um bom serviço público de saúde, um dos melhores da Europa. Temos que melhorar, mas não devemos olvidar que conseguimos ser a 37.ª economia do mundo e somos o 31.º país mais eficiente na área da Saúde, e que em termos de acesso e desempenho, no plano europeu, estamos entre o 12.º e o 14.º lugar”, concluiu.

(19/06/2018)