Comunicado da Sociedade Portuguesa de Medicina Interna sobre o escasso número de internistas

O número divulgado na segunda-feira, em Diário da República, de 129 internistas em carência nos hospitais no SNS não nos espanta, porque é algo que sentimos diariamente nos nossos hospitais, e está, mesmo assim, muito aquém das necessidades. Este é um facto que preocupa a Sociedade Portuguesa de Medicina Interna.
Apesar das sucessivas equipas ministeriais sempre terem apostado na Medicina Interna e terem aberto um número generoso de vagas para a especialidade, a realidade é que corremos atrás do prejuízo: a necessidade de internistas nos hospitais tem crescido de uma forma mais rápida do que o número de internistas admitidos pelos hospitais do SNS. Na realidade temos doentes cada vez mais idosos, com múltiplas doenças, que são abordados preferencialmente pela Medicina Interna. São os internistas que tratam estes doentes nas urgências, nos serviços de Medicina, nas unidades de cuidados intermédios e especiais, nos cuidados intensivos, nos hospitais de dia, nas consultas e são os internistas a quem é solicitado o apoio quando estes doentes são internados nos outros serviços médicos ou cirúrgicos. São os internistas que estão a criar alternativas ao internamento como a hospitalização domiciliária e os que gostariam de se empenhar numa gestão integrada destes doentes com os cuidados primários. São os serviços de Medicina Interna que estão transformados em centros de resolução dos problemas sociais dos doentes, porque é o internamento que desencadeia, a maior parte das vezes, a necessidade de apoio social.

O que temos observado é uma incapacidade de contratarmos os internos que formamos e a quem damos formação para responder a necessidades específicas dos nossos hospitais, vendo-os sistematicamente fugir para os grupos privados de saúde ou hospitais PPP, que têm mais facilidade de contratação e escolha oferecendo-lhes melhores salários e condiçöes. Enquanto isso, os nossos assistentes e internos resistem a fazer horas extraordinárias, porque são mal remuneradas. O que vemos são as especialidades cirúrgicas serem pagas por produção adicional mas os internistas terem que cuidar do dobro dos doentes espalhados por todo o hospital, sem incentivo de qualquer espécie. O que vemos é muitas equipas envelhecidas, com muitos especialistas que já ultrapassaram a idade para fazerem urgências, sem que haja renovação dos quadros. Esta situação ainda se vai agravar mais com a proibição, legítima mas difícil para os hospitais, pela Ordem dos Médicos, de os internos realizarem mais de doze horas de urgência.

Graves rupturas que podem fazem perigar a qualidade da assistência aos doentes têm sido evitadas até agora, pela dedicação, abnegação, competência, solidariedade e sentido ético dos internistas e das internistas portugueses, à custa da vida pessoal, com elevado preço em burn-out e com ameaças importantes à qualidade da formação dos internos, situação que não é sustentável.

Consideramos por isso importante o reconhecimento da carência de internistas nos hospitais do SNS, a necessidade da sua contratação, mas gostaríamos também que houvesse maior flexibilidade e autonomia dos hospitais na escolha das pessoas, mantendo o respeito pela equidade, e que se encontrem formas de compensação económica e outras que tornem mais satisfatória e atrativa a atividade desta especialidade, que é fascinante, e cada vez mais necessária para cuidar dos nossos doentes.

Luis Campos
Presidente da Sociedade Portuguesa de Medicina Interna

(15/07/2016)