Dia Internacional de Consciencialização para a Hepatite C

Rita Serras Jorge

Muitas são as efemérides que somos chamados a celebrar diariamente. Umas são-nos mais caras ou familiares do que outras, mas há datas que não devem deixar ninguém indiferente. Uma delas é o Dia Internacional para a Consciencialização para a Hepatite C. Apesar de classicamente associada aos consumidores de drogas, na realidade, a doença pode atingir várias pessoas sem este fator de risco, como por exemplo, indivíduos submetidos a transfusões sanguíneas antes de 1992, utilizadores de material contaminado não esterilizado (dentário, estético, etc) e ainda que menos comum, pode também ser transmitida por via sexual e de mãe para filho durante a gravidez ou parto. Assim sendo e, dado o facto de poder permanecer assintomática durante vários anos, muitos de nós podemos ser portadores do vírus, estando sob os seus efeitos deletérios mas não só a nível hepático mas também sistémico, e agentes de transmissão.

Posto isto, muitos são os caminhos onde nos conduz este dia. O primeiro é o da prevenção. O combate a comportamentos aditivos, a adoção de procedimentos seguros ao nível do consumo de drogas, as políticas de utilização segura de hemoderivados e de higiene e esterilização são fundamentais no combate à doença e são as que melhor protegem a população na medida em que evitam o contágio. A via da sensibilização da comunidade para as formas de transmissão e para os sintomas da doença são também importantes ainda que numa fase inicial estes sejam relativamente inespecíficos. A sensibilização da comunidade médica é também fundamental e é necessário que a globalidade dos médicos tenha conhecimento das orientações dadas pelo Programa Nacional para as Hepatites Virais da Direção Geral de Saúde, que recomenda que todos as pessoas efetuem o rastreio da infeção pelo menos uma vez na vida. Contudo, sabemos que o diagnóstico se torna mais difícil nalguns grupos de risco particular, como sejam os utilizadores de drogas, os sem abrigo, os profissionais do sexo e os reclusos dado o seu menor contacto com os serviços de saúde. Nesta área, em Portugal, muitos têm sido os passos percorridos, com investimento ao nível da disponibilização de  testes rápidos nalgumas farmácias comunitárias, no acompanhamento de indivíduos em situação de exclusão social na sua comunidade como sejam os que estão em contacto com os Programas de reinserção ou recuperação, os frequentadores de Programas de Consumo Assistido de estupefacientes e os indivíduos inseridos em Estabelecimentos prisionais, possibilitando um diagnóstico de proximidade e um acompanhamento individualizado ao longo de todo o processo. Investir na descentralização dos cuidados médicos é essencial e tem sido o mote de ação dos profissionais envolvidos.

O nosso país foi também pioneiro nas políticas de acesso ao tratamento que é disponibilizado de forma gratuita a todos os indivíduos infetados, independentemente da gravidade da sua doença. Este passo foi crucial no combate à infeção e constituiu um grande exemplo a nível mundial. A disponibilidade de fármacos altamente eficazes na cura da doença, com uma taxa muito baixa de efeitos secundários, coloca no horizonte a esperança da erradicação da doença.

Ainda assim, a incidência de novos casos a nível mundial é superior a 1 milhão e, em conjunto com as restantes formas de hepatites virais, a doença está entre as principais dez causas de morte no mundo.

Consciencializar para a Hepatite C é de facto refletir de que temos ao nosso dispor uma sociedade desenvolvida a nível científico, com várias possibilidades de ação na prevenção, rastreio, diagnóstico e tratamento mas que ainda assim nos deparamos com morbimortalidade evitável. Cada um de nós, profissionais de saúde e sociedade civil, pode ser agente de mudança e sensibilização.  Evite comportamentos de risco e faça o seu teste!

Rita Serras Jorge – Núcleo de Estudos das Doenças do Fígado da SPMI

(01/10/2023)