Projetos de integração de cuidados no SNS reduzem «idas às urgências e episódios de internamento»

O presidente da Sociedade Portuguesa de Medicina Interna (SPMI), Luís Campos, considera que “uma forma do Ministério da Saúde demonstrar o empenhamento nas reformas de proximidade, particularmente na integração de cuidados, “é começar por apoiar em termos políticos e de angariação de recursos os projetos de cuidados integrados que começam a surgir no terreno, em várias regiões do país”.

Aquele médico falava numa mesa-redonda sobre “Integração de cuidados no SNS”, no evento “Percursos de vida, Literacia em saúde, integração de cuidados – reformas de proximidade”, que decorreu na Escola Superior de Tecnologia da Saúde de Lisboa.

Luís Campos, que também é diretor do Serviço de Medicina do Hospital S. Francisco Xavier (CHLO), presidente do Conselho Nacional para a Qualidade em Saúde e um dos membros do Grupo de Trabalho para as Reformas de Proximidade do Ministério da Saúde, destacou o exemplo dos projetos de integração de cuidados na Unidade Local de Saúde (ULS) de Matosinhos, na ULS do Litoral Alentejano, no Hospital Garcia da Orta e no Centro Hospitalar Lisboa Ocidental / ACES Oeiras.

“Estes projetos poderão ajudar a diminuir as idas às urgências e os episódios de internamento”, garantiu, lembrando como tem aumentado o número de patologias crónicas e, particularmente, “a emergência de um grupo de doentes idosos, frágeis e com multimorbilidades que invadiu os hospitais, sendo os grandes consumidores dos recursos da saúde”.

No seu entender, têm sido tratados “de forma reativa, fragmentada, episódica, através das urgências, com uma intervenção centrada na doença e em que o doente é considerado um sujeito passivo”. Defendeu, assim, ser necessário mudar este paradigma e garantir a estes doentes “cuidados proativos, com continuidade, integrados e centrados no doente e não na doença”.

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E continuou: “É essencial, ainda, investir no seu empoderamento e na promoção dos autocuidados, não esquecendo que a integração envolve todos os níveis, desde a prevenção e promoção da saúde, passando pelos cuidados primários e pelos hospitais, até aos cuidados continuados e paliativos.”

Todas estas alterações devem também envolver um novo modelo de contratualização, “que estimule mais a integração de cuidados, e não como o atual, em que os hospitais recebem pelo número de doentes admitidos nas urgências ou pelo número de internamentos”.

Considerou também inadequado o modelo atual de organização hospitalar, “espartilhado por órgãos ou sistemas”. “Os doentes devem ser admitidos em departamentos geridos pela Medicina Interna, que coordenará a intervenção das outras especialidades, é um modelo já adotado, com sucesso, por alguns hospitais, como o Beatriz Ângelo ou o Pedro Hispano”, indicou.

Outro dos aspetos sublinhados por Luís Campos passa pela necessidade de integrar a saúde com a assistência social: “Os hospitais e, principalmente, os serviços de Medicina estão transformados em centros de resolução dos problemas sociais dos doentes e a insuficiência da resposta, neste domínio, prolonga os internamentos, aumentando a morbilidade e a mortalidade.”

O especialista deixou também algumas recomendações para se implementarem programas de cuidados integrados. “Devem-se diversificar as experiências, monitorizar, avaliar e disseminar as boas práticas; educar os profissionais e os cuidadores e promover a literacia; estimular e apoiar as lideranças clínicas; garantir a utilização plena das potencialidades das tecnologias de informação e comunicação e optar por mudar a contratualização para tornar esta mudança sustentável e não por experiências-piloto com financiamento autolimitado”, afirmou.

Luís Campos finalizou a sua intervenção acrescentando que, “apesar de termos um sistema um pouco esquizofrénico, onde temos os centros de saúde fundidos com os hospitais nas ULS ou completamente separados, existe um conjunto de profissionais muito competentes e duas especialidades médicas generalistas, como o são a Medicina Geral e Familiar e a Medicina Interna, fortes, alinhadas e disponíveis para se empenharem nesta mudança”.

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A mesa-redonda em que participou o presidente da SPMI contou ainda com o contributo de Rui Santana, investigador na Escola Nacional de Saúde Pública; António Gabriel Martins, coordenador da UCC Mateus – ACES Douro Norte; Henrique Botelho, coordenador nacional para a reforma do SNS na área dos cuidados de saúde primários; Jaime Branco, diretor do Serviço de Reumatologia do Hospital Egas Moniz, CHLO; e Neusa Festas, da Segurança Social. A moderação esteve a cargo de Rosa Valente Matos, presidente da ARS Lisboa e Vale do Tejo.

Josep Figueras, Tiago Brandão Rodrigues, Adalberto Campos Fernandes, Hans Kluge e Constantino Sakellarides.

Josep Figueras, Tiago Brandão Rodrigues, Adalberto Campos Fernandes, Hans Kluge e Constantino Sakellarides.

Além de Luís Campos (área hospitalar), o Grupo de Trabalho para as Reformas de Proximidade do Ministério da Saúde é constituído por Rui Santana (políticas e gestão em saúde), Humberto Martins (farmacêutico), José Luís Biscaia (cuidados primários), André Peralta-Santos (saúde pública), Patrícia Barbosa (segurança social) e Manuel Lopes (cuidados continuados). A coordenação está a cargo de Constantino Sakellarides, ex-diretor da Escola Nacional de Saúde Pública.

 

Luís Campos e Constantino Sakellarides.

Luís Campos e Constantino Sakellarides.

(24/10/2016)